REDES SOCIAIS
Caso de agente da PRF evidencia, mais uma vez, que geração influencer é o desastre social do século
A princípio, o questionamento de Okasaki pode soar inofensivo, apenas o desabafo feito em uma rede social.
21/04/2025, 09:17 -

Há de se saber até onde os membros não só da PRF, mas de qualquer órgão ou instituição podem ir na exposição do que fazem e pensam sem comprometer e arrastar suas corporações para engajamentos que, destaca-se, elas não devem ter.
Trajando farda, em tom solene e olhar fixo, como quem transmite um posicionamento oficial, o agente da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Anderson Okasaki, conhecido nas redes sociais pelas postagens mostrando a rotina como membro da instituição policial, publicou um vídeo na última semana no qual, ao tecer uma reflexão sobre a morte de três agentes da PRF durante uma ação no Rio de Janeiro, diz: “Será que vale a pena? Será que vale a pena lutarmos por uma sociedade que, muitas vezes, não valoriza o trabalho da polícia e se limita a nos criticar?”.
A princípio, o questionamento de Okasaki pode soar inofensivo, apenas o desabafo feito em uma rede social. Mas quando olhamos o conjunto da obra, percebemos que o vídeo do agente é fruto de uma geração que há muito deixou de perceber a linha essencial que separa o ser público do privado.
Ao aparecer fardado e colocando em xeque a necessidade do propósito de sua instituição, verbalizando, literalmente, o pensamento de que talvez não haja sentido em um servidor da segurança pública exercer sua função (“será que vale a pena?”) por causa de críticas de uma parcela da população, o agente confunde seus milhares de seguidores, os induzindo a pensar que ele fala pela polícia e expõe que ela não mais vê motivos para cumprir seus deveres.
Por óbvio, a PRF – agora sim, em um posicionamento oficial, declarou que “discursos individuais não autorizados não representam o posicionamento da instituição e que condutas que induzam a tal interpretação, como fazer uso do uniforme para manifestação subjetiva e divulgação de conteúdo sem a devida autorização, ferem normas internas do órgão”. Ainda no comunicado, a instituição informou a abertura de uma Investigação Preliminar Sumária, por meio da corregedoria, contra Okasaki.
Justiça seja feita, o agente da PRF em questão tem, sim, bons vídeos e com conteúdo informativo e pertinente. Admitamos que é fascinante acompanhar o dia a dia de uma das instituições da segurança pública mais atuantes e importantes do País. No entanto, há de se saber até onde os membros não só da PRF, mas de qualquer órgão ou instituição podem ir na exposição do que fazem e pensam sem comprometer e arrastar suas corporações para engajamentos que, destaca-se, elas não devem ter.
O preocupante é que exposições controversas em busca de likes e compartilhamentos deixaram de ser casos isolados para se tornarem a marca de uma geração inteira. Já nos deparamos com casos de policiais que chegaram ao ponto de contratar agências de filmagens para gravar as ações em combate e usar aquele material, posteriormente, para autopromoção. Quem não se lembra do Delegado da Cunha, que confessou publicamente ter encenado o vídeo do flagrante de um sequestro em uma comunidade paulista – tão somente para ter engajamento nas redes sociais?
São tempos inquietantes em que órgãos e instituições que construíram suas reputações ao longo de décadas (algumas, até de séculos), agora se veem forçadas a agir diante de membros que usam o status dessas mesmas reputações para, de forma insensata, ter engajamento na internet e aumentar o número de seguidores em redes sociais. No final de tudo, a impessoalidade tão necessária no meio público pode ter dado lugar ao “Curte, me segue e se inscreva no canal”. (Fonte: Por Ton Paulo-jornalopcao).